quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Havia filisteus na Palestina na época de Abraão?

       
       Gênesis 20 relata a viagem de Abraão a Gerar, onde ele apelou para a mentira sobre seu verdadeiro relacionamento com Sara, a fim de livrar-se do perigo de ser assassinado, caso viessem a saber que ela era sua esposa. O capítulo 21 registra o episódio em que ele assegura os direitos de propriedade do poço de Berseba. A seguir, lemos: "Firmado esse acordo em Berseba, Abimeleque e Ficol, comandante das suas tropas, voltaram para a terra dos filisteus" (v. 32). Em Gênesis 26.1, somos informados de que "Isaque foi para Gerar, onde Abimeleque era rei dos filisteus". (Podemos presumir com segurança que, tendo havido um intervalo de mais de sessenta anos entre os capítulos 21 e 26 [cf. 25.26], o Abimeleque mencionado em 26.1 era filho ou neto do outro cujo nome herdara, costume freqüente entre os nobres das dinastias egípcias e fenícias.)

       Essas referências aos filisteus como existentes antes de 2050 a.C. (no caso de Abraão) têm sido consideradas impossíveis por muitos estudiosos. A Encyclopaedia Britannica (14a ed., s.v. "Filistia") declara categoricamente: "Em Gênesis 21.32, 34 e Êxodo 13.17; 15.14; 23.31, as referências à Filistia e aos filisteus são anacrônicas". A base dessa assertiva encontra-se na circunstância de que até o presente momento, pelo menos, a mais antiga referência a filisteus nos registros egípcios encontra-se nos relatos de Ramesés III, com respeito à sua vitória sobre os "povos do mar" numa batalha naval travada no rio Nilo em 1190 a.C. Supõe-se que depois de os P-r-s-t (como os egípcios grafavam o nome deles) e seus aliados terem sido expulsos pelo faraó, retiraram-se para a região costeira da Palestina e ali se estabeleceram permanentemente como colônia militar. Entretanto, não se pode concluir, a partir desse mero fato, e que as referências mais antigas aos filisteus nos registros egípcios (que datam de mais ou menos 1190 a.C.) constituem prova objetiva de que jamais houve imigrantes filisteus de Creta, na Palestina, em tempo algum, antes dessa data; tal conclusão seria violação irresponsável da lógica.

       As Escrituras Sagradas constituem o registro mais digno de confiança, mais que os documentos arqueológicos, visto que aquelas estão investidas da confiança divina do princípio ao fim e afirmam com toda a clareza que os filisteus moravam na Filistia pelo século XXI a.C. Afirmam também as Escrituras que as fortalezas filistinas que guardavam a rota do norte do Egito para a Palestina eram tão poderosas nos dias mosaicos (em 1140 a.C), que o caminho mais seguro para os israelitas em sua jornada para a Terra Prometida era o do sul (Êx 13.17). É óbvio que esse registro feito por Moisés foi composto séculos antes do de Ramsés III, não havendo razão para supor-se que, quanto mais antigo for um documento, menos digno de confiança deve ser. (Até recentemente usava-se o argumento do silêncio por alguns críticos para desacreditar as referências em Gênesis 18 e 19 a Sodoma e Gomorra, que teriam sido meras lendas destituídas de historicidade. Agora, depois de terem sido descobertas as tabuinhas de Ebla, datadas do século XXIV a.C., que contêm informações sobre o relacionamento comercial de ambas as cidades com Ebla, aquele argumento contrário tornou-se absurdo. G. Pettinato ["BAR Interviews Pettinato", p. 48], a respeito de referências a Si-da-mu e a I-ma-ar). De novo se comprovou que o argumento baseado no silêncio é enganoso. As cinco principais cidades dos filisteus, ou pelo menos aquelas que foram escavadas, demonstram igualmente a existência de uma ocupação que se estende até os tempos dos hicsos, e mesmo antes. 

        O nível mais antigo descoberto em Asdode é com toda certeza, do século XVII a.C. (cf. H. F. Vos, Archaeology in Bible lands [Chicago, Moody, 1977], p. 146). Selos encontrados em Gaza trazem os nomes da décima segunda dinastia de reis do Egito, como Amenemhat III (ibid., p.167). Daí não pode haver dúvida de que essa área foi ocupada por reinos poderosos antigos na era dos patriarcas. É possível que suas populações tenham sido pré-filistéias, mas não existe prova disso. A costa sul da Palestina com toda certeza teria sido uma região favorável ao comércio e ao estabelecimento definitivo dos povos, no que diz respeito à população cretense. As Escrituras referem-se aos filisteus como pertencentes a vários grupos, como os caftoritas, os queretitas e os peletitas. As atividades comerciais de Creta Minoana teriam sido intensas; seus marinheiros teriam descoberto ainda antes do tempo de Abraão que o litoral filisteu era dotado de clima ameno, solo rico e dadivosas chuvas para as colheitas de cereais. Aparentemente emigraram para lá em levas sucessivas, mais ou menos da forma como os dinamarqueses emigravam para a costa leste da Inglaterra ao longo de um período de séculos até que "Danelaw" alargou-se a ponto de cobrir toda a região da fronteira escocesa até a própria Londres. As migrações das populações que saem de sua terra natal, atravessando mares, são um fenômeno freqüente por toda a história do mundo; por isso, não deveria causar surpresa a migração contínua dos povos cretenses e sua fixação ao longo de vários séculos, a partir da época anterior a Abraão até o período da expedição naval fracassada contra o Egito, no início do século XII a.c. Portanto, podemos concluir que não existem evidências verdadeiramente científicas para que se classifiquem as referências aos filisteus no Pentateuco como destituídas de veracidade histórica ou anacrônicas.

Bibliografia: Archer; Gleason L. Enciclopédia de Temas Bíblicos

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