quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Qual é a explicação para o dia prolongado de Josué 10.12-14?

“No dia em que o Senhor entregou os amorreus aos israelitas, Josué exclamou ao Senhor, na presença de Israel: "Sol, pare sobre Gibeom! E você, ó lua, sobre o vale de Aijalom!" O sol parou, e a lua se deteve, até a nação vingar-se dos seus inimigos, como está escrito no Livro de Jasar. O sol parou no meio do céu e por quase um dia inteiro não se pôs. Nunca antes nem depois houve um dia como aquele, quando o Senhor atendeu a um homem. Sem dúvida o Senhor lutava por Israel! ” (Josué 10:12-14)(NVI)

     Um dos milagres mais comentados e discutidos da Bíblia é o que se refere a um dia prolongado no Livro de Josué, corrido na batalha de Gibeom. Tem-se objetado que, se de fato a Terra houvesse parado de girar por 24 horas, uma catástrofe inconcebível teria esmagado o planeta e tudo que estivesse em sua superfície. Para os que creem na onipotência de Deus de modo nenhum concordam com a ideia de que O SENHOR não teria impedido a tragédia; suspendendo temporariamente as leis físicas que provocariam o desastre. No entanto, com base no próprio texto hebraico, não nos parece necessário crer que a Terra subitamente tenha parado, deixando de executar o movimento de rotação sobre si mesma. Assim diz o versículo 13: "O sol parou no meio do céu e por quase um dia inteiro não se pôs". A frase "não se apressou" (RA) parece indicar um retardamento do movimento solar (ou seja, da rotação da Terra). Em vez de 24 horas, o dia teria tido quase 48 horas.[1] 

     Há apoio para essa ideia: pesquisas trouxeram à luz relatos de fontes egípcias, chinesas e hindus a respeito de um dia muito longo. Harry Rimmer relata que alguns cientistas astrônomos chegaram à conclusão de que está faltando um dia inteiro no cálculo astronômico. Declara Rimmer que alguns cientistas do Observatório de Harvard traçaram a origem desse dia que falta aos tempos de Josué. De semelhante modo se pronuncia Totten, de Yale [2].

      Outra possibilidade de interpretação decorre de um entendimento um tanto diferente da palavra dôm (traduzida por KJV por "mantém-te quieto"). É vocábulo que normalmente se traduz por "estar em silêncio", "cessar" ou "partir". E. W. Maunders, de Greenwich e Robert Dick Wilson, de Princeton, interpretaram a oração de Josué como petição no sentido de o Sol cessar de derramar seu calor sobre suas tropas em batalha, de tal modo que pudessem prosseguir lutando sob condições mais favoráveis. A tempestade destruidora, de granizo, que acompanhou a batalha, dá alguma credibilidade a essa opinião, a qual tem sido defendida por homens de inquestionável ortodoxia. No entanto, é preciso que se admita que o versículo 13 parece favorecer o prolongamento do dia: "O sol parou, e a lua se deteve, [...] O sol parou no meio do céu e por quase um dia inteiro não se pôs" (ARA).

     Keil e Delitzsch (Joshua, Judges, Ruth, p. 110) sugerem que ocorreu um prolongamento miraculoso do dia, de modo que apenas apareceu a Josué e a todo o Israel que ele se prolongou de fato. O exército conseguiu fazer em um dia o trabalho de dois. Teria sido difícil para eles dizer se a Terra estava girando à velocidade normal se a rotação fosse o único critério para a medida do tempo. Eles acrescentam outra possibilidade: Deus poderia ter produzido um prolongamento da luz solar, tendo prosseguido a visibilidade após a hora normal do crepúsculo, mediante uma refração especial dos raios solares.

          Samuel Schultz [3] parece concordar com essa opinião. Em sua obra "A História de Israel no Antigo Testamento" ele diz:
"(...) E também aos israelitas foi dado um longo dia para que perseguissem seu inimigo. A ambiguidade da linguagem concernente a este longo dia de Josué tem dado origem a variadas interpretações. Era esta uma linguagem poética? Solicitou Josué uma maior duração da luz do sol ou para descanso do calor do dia? [4] Se for uma linguagem poética, então somente se trata de uma chamada feita por Josué por ajuda e forças [5]. Como resultado, os israelitas foram de tão modo revigorados que o trabalho de um dia foi realizado em metade de um dia. Aceito como uma prolongação da duração da luz, isto foi um milagre no qual o sol ou a lua e a terra ficaram detidos [6]. Se o sol e a lua detiveram seus cursos regulares, pôde ter sido um milagre de refração ou uma miragem dada sobrenaturalmente, estendendo a luz do dia de forma tal que o sol e a lua pareceram ficar fora de seus cursos regulares. Isto proporcionou a Israel mais tempo para perseguir a seus inimigos [7]. A chamada de Josué em favor da ajuda divina pôde ter sido uma solicitude de alívio para que diminuísse o calor do sol, ordenando que o sol permanecesse silencioso ou mudo, quer dizer, que evitasse brilhar tanto. Em resposta, Deus enviou uma tormenta de saraiva que proporcionou tanto o alívio do calor solar como a destruição do inimigo. Os soldados, refrescados, realizaram um dia de marcha em meio dia de duração desde Gibeom até Maquedá, uma distância de uns 48 km [8], e lhes pareceu um dia completo quando em realidade só havia transcorrido meio dia. Embora o relato de Josué não nos proporcione detalhes de como aconteceu aquilo, resulta aparente que Deus interveio em nome de Israel e a liga dos amorreus foi totalmente derrotada."
      Hugh J. Blair ("Joshua", em Guthrie, New Bible commentary, p. 244) sugere que a oração de Josué teria sido pronunciada bem cedo, de manhã, visto que a luz ainda estava no Ocidente, e o Sol, no Oriente. A resposta veio na forma de uma tempestade de granizo que prolongou a escuridão e, dessa forma, facilitou o ataque de surpresa dos israelitas. Daí, na escuridão da tempestade, a derrota do inimigo foi completa. Deveríamos, pois, falar da "longa noite" de Josué, em vez de o "longo dia". Essa é, em essência, a opinião de Maunders e Wilson. Essa interpretação não pressupõe a parada do movimento de rotação da Terra em seu eixo, embora dificilmente se enquadre na declaração de Josué 10.13. Portanto, é uma interpretação de valor dúbio.

     Realmente, evento do dia prolongado não é facilmente explicado. Porém, é preciso reconhecer que Aquele que fez as leis da Natureza tem o direito de usá-las de acordo com seus objetivos.  Aquele que usou as pedras de granizo como arma de destruição contra seus inimigos também poderia usar a luz e as trevas para servirem aos seus propósitos. A soberania de Deus sobre a natureza o capacita a promover seu reino espiritual pelo uso do mundo físico. O salmista enfatizou que todo o universo visível existe para propósitos espirituais. Ele afirmou que “os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite” (Sl. 19.1,2). Também declarou que “do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam” (Sl. 24.1). Josué não demonstrou hesitação ao chamar as forças do universo para ajudá-lo contra aqueles que se opunham a Deus (v.12). A declaração de que "não houve dia semelhante a este, nem antes nem depois dele" (v.14) reafirma a singularidade deste evento. Também destaca o fato de que Deus usa milagres com grande reserva. Ele evita que os homens se tornem dependentes deles. Deus insiste que devemos depender dEle próprio, que realiza os milagres. ” [9]


Prof. Saulo Nogueira

Referências:

[1] Archer, Gleason L. Enciclopédia de Temas Bíblicos - 2. ed. - São Paulo: Editora Vida, 2001. Pg. 142.

[2],[4] Para obter um sumário de vários pontos de vista, cf. Bernard Ramm. The Christian view of science and Scripture. Grand Rapids, Eerdmans, 1955. Pg. 156-161.

[3] Schultz, Samuel. História de Israel no Antigo Testamento - 2ª ed. - São Paulo: Editora Vida Nova, 2009. Pg.121-123.

[5] Para um discussão representativa, ver o artigo intitulado:"Sol", em Davis. Dicionário da Bíblia. Rio de Janeiro, Casa Publicadora Batista, 1973. Pg. 569-570.

[6] Cf. R. A. Torrey. Difficulties in the Bible, (1907, p. 53); Josefo, "Antiquities of the Jews", v. 1:17 e Eclesiástico 46.4.

[7] Cf. A. Rendle Short. Modern Discovery and the Bible. Londres, Interversity Fellowship of Evangelical Unions, 1943, p. 117, e Lowell Butler "Mirages are Light Benders", Jourmal of the American Scientific Affiliation, dezembro 1951.


[8] Cf. D. Maunder, "The Battle of Beth-Horon" The International Standard Bible Encyclopedia, I, 446-449. Ver também Robert Dick Wilson "What does the sun stood still mean?" Moody Monthly, 21:67 (outubro de 1920), interpreta as palavras traduzidas por "detém-te" como se significassem "escurece-te", com base da astronomia babilônica. Hugh J. Blair "Josué" em O Novo Comentário da Bíblia. São Paulo, Vida Nova, pg. 265, sugere que Josué fez tal petição na manhã para que a tormenta de saraiva prolongasse a escuridão.

[9] Comentário Bíblico Beacon. Josué a Ester - 4ª ed. – Rio de Janeiro: CPAD, 2012. Pg. 51

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